A valorização do diálogo no Estado Democrático Brasileiro: uma questão de princípios

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Com a crescente demanda por direitos sociais, que ganha força no pós-Segunda Guerra Mundial, a formação do Estado sofre uma hipertrofia não só em termos de “crescimento da máquina pública”, mas também de crescimento na discricionariedade do Poder Público. Tudo em vista do bem comum. Em vista do Interesse Público.
Nesse sentido, a burocratização do setor público, conforme postulado por Weber, encontra seu paradoxo no próprio princípio democrático (sim, nesse caso assumimos a própria Democracia como princípio constitucional, conforme assevera Ayres Britto [2002]). Ora, como o Estado pode fazer algo pelo povo sem consultar o povo? Os mais legítimos e titulares corolários dos direitos ora em via de concretização.
Ou seja, como o ele pode decidir o que é bom para mim, para nós? É legítimo que uma minoria de representantes possa decidir pelo futuro de todos? Será que a democracia representativa não encontra exatamente neste ponto o seu limite?
A retomada da dialética aristotélica pela Escola de Frankfurt (surgida de uma dissidência Marxista que, pasmem, era acusada de subverter os próprios preceitos para defender partidos, como dizem, a vida imita a arte, ou vice-versa) dará o tom do debate à importante escolha sobre o futuro de uma nação. Habermas trará a importância da Esfera Pública e do poder discursivo como forma de manifestação legítima da população.
Isto significa um retorno aos primórdios helênicos de democracia direta?
Nada disso.
A democracia direta grega era excludente, já vimos. E fica muito fácil tomar decisões em um campo direto e mais ou menos homogêneo e com isso justificar formalmente uma escolha partidarizada.
A questão não era essa. Era mesclar a conjuntura estatal de um Estado de Bem Estar com toda sua complexidade e burocratização (mais do que necessária, diga-se de passagem) ao sistema representativo e ao crivo popular. E como isso funciona? Simples. O povo elege, os representantes pautam, tomam suas decisões e voltam a pauta pro povo dizer concordar ou não. Quem acredita, digita “amém”. Quem não, só fica olhando.
A teoria habermasiana, nesse sentido, coloca todas as suas fichas nesse processo de influência que o discurso exerce. A pressão popular.
Mas existem dois pequenos problemas: o que garante que esses espaços serão dados? E se a população for dogmatizada previamente?
AHHHHHH!! Prazer, te apresento a República Federativa do Brasil. Em quase TODOS seus possíveis microcosmos.
Sabem aquela frase famosinha? O Poder corrompe.
Ele traz aos seus titulares a ilusão da autossuficiência. Corroborada por um processo midiático de tendências partidárias e/ou classistas, que não só perpetua a ilusão de autossuficiência dos eleitos, mas também turva a visão do povo para a real conjuntura social e política do país.
No entanto, no alvorecer da justiça, eis que surge a lei para garantir que estes espaços de diálogo ocorram de fato.
Nesse sentido, a Constituição de 1988 institui como princípio basilar das políticas públicas a Participação Popular. Tendo em vista que essas políticas definirão o repasse de quantias substanciais de verba para educação, saúde, assistência social, previdência e infinitas outras, além de construir os ditames de toda a organização e concretização dos direitos sociais, nada mais justo do que o povo participar do processo decisório. O Estado (o que se espera) capacitado tecnicamente faz todas as análises e pergunta se é isso mesmo que deve ser feito. O conhecimento local sempre deve ser privilegiado.
Assim o povo é consultado em audiências, plebiscitos, referendos, e Conferências e Conselhos de Políticas Públicas. E, por fim, também através da Política Nacional de Participação Social.
Impossível falar de todos estes instrumentos de uma só vez. Deixo para a próxima oportunidade.
O que cumpre frisar aqui, é que a representação política de per si, em qualquer instância, não é suficiente para tomar decisões com a razoabilidade que elas merecem, nem mesmo com a legitimidade que clamam. O povo DEVE ser consultado. Legitimidade democrática NÃO se encerra nas urnas, nem tampouco em ambientes reduzidos de participação. A voz e as diferenças têm de ser efetivas.
Até porque uma hora as pessoas fatalmente se cansam de serem ignorados e se insurge (vide manifestações de Julho de 2013 e seq.).
E quando ele se insurge não adianta reclamar de Golpe (embora sua existência possa existir). Pois golpe ou não golpe, granjear a antipatia dos seus representados é a morte política.
Um Governo que não ouve, representantes que não ouvem, representam um “legítimo” nada.
Demos fala a quem tem voz.
Demos kratia!




Adolfo Mariano

 Coordenador-Executivo do Núcleo de Cidadania Ativa



[1] Originalmente publicado em minha coluna na revista jurídica eletrônica Lex Populi em 15 Mar. 2016. Link:
http://bloglexpopuli.blogspot.com.br/2016/05/a-valorizacao-do-dialogo-no-estado.html
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